Quem foi D. Afonso V, o Africano saiba mais sobre a sua vida e seu reinado

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D. Afonso V foi o décimo segundo rei de Portugal, apesar de ser um dos reis menos conhecidos da nossa história, é importante conhecer mais sobre a sua vida.

D. Afonso V era filho de D. Duarte e de D. Leonor de Aragão. Testemunhos escritos descrevem-no como um homem de presença forte e graciosa: “Grande, e robusto do corpo, de presença verdadeiramente real, e agradável. O cabello da cabeça, e barba comprido, e castanho, e ordinariamente o trazi mui composto. Fallou a lingua Portugueza com natural eloquencia, e tanta composição que sempre sua pratica parecia estudada”.

 

D. Afonso V tinha uma personalidade muito rica, conciliou a intelectualidade e a eloquência com as aptidões de um militar. Nunca lhe faltou a visão de Estado durante um reinado complexo e rico em discórdias e conquistas.

 

Quem foi D. Afonso V

 

Apesar do caráter humanitário e generoso, não esteve isento de duras críticas. Havia quem considerasse que a sua irresponsabilidade e fraqueza eram usadas pelos nobres, pois concedeu-lhes muitos privilégios e não prosseguiu com a política centralizadora implementada pelos seus antecessores.

 

Antes de tomar qualquer decisão importante, D. Afonso V consultava a opinião dos outros, o que levou muitas pessoas a pensar que ele nada fazia por iniciativa própria. Provavelmente, pretendia conciliar o reforço da organização e do crescimento do reino e dos poderes da Coroa com uma distribuição do poder pelos nobres, que tentava reforçar com a finalidade de estes virem a ser úteis.

 

A sua política expansionista também causou desentendimentos. Por um lado, agradava a nobreza, desejosa de obter fama e adquirir bens, mas, por outro, enfrentou a oposição daqueles que preferiam um bom governo do reino em vez das aventuras além-fronteiras. A opção pela expansão foi vantajosa. Durante o seu reinado, assistiu-se a acontecimentos muito importantes nos Descobrimentos e à conquista de novas praças marroquinas.

 

Ao mesmo tempo intensificou-se a capacidade comercial portuguesa, bem como a obtenção de resultados económicos favoráveis. Mais uma vez, a posição política de D. Afonso V teve dupla interpretação. Para muitos, esta expansão foi fruto de um simples devaneio ou da pressão da nobreza, para outros, foi uma aposta assente numa estratégia bem planeada. Inegável é que as suas iniciativas possibilitaram a consolidação do poder do reino e reforçaram o seu prestígio.

 

Em termos históricos, o reinado deste monarca pode dividir-se em três períodos distintos. O primeiro estende-se de 1438, quando ascendeu ao trono por morte do pai, até à Batalha de Alfarrobeira (1449).

  D. Afonso V tinha seis anos quando assistiu à morte de D. Duarte, o qual delegou em testamento a regência à sua mulher D. Leonor de Aragão. Este facto desagradou à burguesia e ao povo, que preferiam como regente o infante D. Pedro, irmão de D. Duarte. O conflito entre estas duas posições criou um período de instabilidade política. A rainha veio a abandonar a representação nas Cortes de 1439, sendo D. Pedro declarado “Regedor e Defensor do Reino”. Face a esta crise, D. Leonor exilou-se em Castela, mas os conflitos não terminaram, pois mesmo fora do país reivindicava os direitos à regência.

 

A educação de D. Afonso esteve a cargo de D. Pedro, considerado um dos príncipes mais cultos da época, que detinha vastos conhecimentos e múltiplas experiências de viagens, sendo, por isso, conhecido como o Infante das Sete Partidas. O regente era a pessoa ideal para transmitir ensinamentos fundamentais ao jovem.

 

A transferência formal dos poderes para D. Afonso ocorreu quando este atingiu a maioridade, aos 14 anos, em 1446, mas não dispensou o auxílio do tio na governação do reino. A relação entre D. Pedro e o jovem até então tinha sido exemplar. No entanto, as intrigas de alguns membros da nobreza e do clero, que se posicionavam contra o antigo regente, originaram desentendimentos entre os dois, o que levou o monarca a dispensar os serviços do tio e a demitir os seus partidários dos cargos que ocupavam.

 

Frustradas as hipóteses de reconciliação, em 1449 encontraram-se frente a frente na Batalha de Alfarrobeira, na qual D. Pedro foi morto. O rei saiu vitorioso, afirmando a sua determinação e força, características que nunca mais voltaria a demonstrar com tanta intensidade durante o seu reinado.

 

Entretanto, já D. Afonso V estava casado, desde 1446, com a sua prima D. Isabel, filha do infante D. Pedro e de D. Isabel de Urgel, com quem teve três filhos: João (que morreu em criança), Joana e João. O matrimónio acabaria com a morte da rainha, em 1455.

 

A filha do monarca, apesar da oposição da família que a queria casar por questões políticas, optaria pela vida religiosa em clausura, vindo a ser conhecida, após a sua morte, como Princesa Santa Joana. Por sua vez, o príncipe, viria a ser preparado para herdar o trono português e tornar-se D. João II.

 

As campanhas no Norte de África, que anunciam a segunda fase do reinado de D. Afonso V, foram tão notáveis que lhe valeram o cognome de o Africano. Em 1453, assistiu-se à queda de Constantinopla e com o avanço dos turcos na Europa o papa Calisto III apelou a uma Cruzada, a que o rei português respondeu prontamente. Mediante o fracasso desta missão, o monarca virou-se para a conquista de África, interrompida devido à tragédia de Tânger. Em 1458, conquistou-se a praça marroquina de Alcácer Ceguer e, em 1471, Arzila e Tânger.

 

Estas vitórias foram importantes para a expansão portuguesa e D. Afonso V saiu tão dignificado com estas e com outras explorações, que passou a usar o título de Rei de Portugal e dos Algarves, de aquém e de além-mar em África. A expansão seguiu o seu ritmo, mas a responsabilidade de a comandar foi entregue ao filho D. João.

 

A terceira fase do reinado de D. Afonso V foi marcada pela campanha castelhana, que não reuniu consenso. Alguns interpretaram o conflito castelhano como o fruto da ambição desmedida do rei, que visava unir as duas nações ou, simplesmente, do seu instinto de guerreiro. Outros defendiam a sua intervenção pelo relacionamento que mantinha com D. Henrique IV, considerando que deveria defender os seus interesses.

 

Na origem do desentendimento estava a sucessão ao trono castelhano. No testamento, D. Henrique IV, casado com a irmã de D. Afonso V, D. Joana de Portugal, pediu ao cunhado que casasse com a sobrinha Joana. A ela competia suceder no reino de Castela, porém corria o rumor que o rei era impotente e que o seu verdadeiro pai era Beltrán de la Cueva, um fidalgo castelhano, daí a sua alcunha de Joana a Beltraneja. Os partidários da princesa pediram auxílio ao rei português, que, invocando esta cláusula testamentária e visto que era viúvo, decidiu casar com D. Joana e defender os seus direitos ao trono contra os futuros reis católicos, Fernando e Isabel. O matrimónio realizou-se em 1475, mas o papa nunca reconheceu a sua validade.

 

Em consequência desta disputa deu-se a Batalha de Toro, em 1476, na qual o rei português saiu derrotado. Nesse mesmo ano, visitou Luís XI, em França, com a intenção de lhe pedir ajuda na disputa com Castela. Apesar de ter sido recebido com muitas honras, o monarca francês negou-lhe o apoio, que anteriormente lhe havia prometido.

 

Desiludido, D. Afonso V escreveu ao filho ordenando-lhe que assumisse o trono, pois pretendia abdicar do seu poder régio e partir para a Terra Santa. Contudo, movido pelo interesse e pelo amor dos seus súbditos e filhos, regressou ao reino um ano depois e ocupou novamente o trono.

 

Depois deste fracasso político, militar e diplomático, D. Afonso V nunca mais viria a desempenhar as suas funções reais com o sucesso do passado. Renunciando aos direitos à Coroa castelhana e reconhecendo os seus adversários como reis, assinou, em 1479, o Tratado de Alcáçovas, o qual foi ratificado um ano mais tarde.

 

Esta derrota no final do reinado deixou D. Afonso V profundamente abalado e a sua autoridade fragilizada perante a população. Depois disso pouco tempo viveu. Foi sepultado no Mosteiro da Batalha.

 

Saliente-se que, a nível cultural, o Africano foi um protetor das artes e das letras. Era um homem faustoso e estas duas áreas só beneficiaram com esta sua faceta, como provam os painéis de Nuno Gonçalves, as tapeçarias de Pastrana, as honras que ofereceu aos sábios e a sua valiosa biblioteca.

 

Foi durante o seu reinado que foram publicadas as Ordenações Afonsinas, a primeira compilação das leis do reino.